15.5.09

A MPB em seu esplendor - Parte I

Quem já se entendia por gente no final da década de 70 do século passado pôde vivenciar um dos períodos mais férteis da música popular brasileira, com discos mais bem feitos que esconderijo de Osama Bin Laden. Muitos dos cantores de MPB – sigla que, por sinal, começou a ser empregada em meados da década anterior, com os festivais de música -, lançaram, nesses anos, alguns de seus melhores discos. Tantas canções de qualidade em tão poucos anos é algo difícil de se repetir. Os LP’s desses cantores eram bastante esperados, da capa ao conteúdo, e a qualidade, em geral, superava as expectativas. Além do mais, ainda tínhamos Elis, Vinícius, Nara e Clara.

Evoé, jovens à vista, duas grandes cantoras começaram a carreira nesse período, contando com o aval de nada menos que Chico Buarque: Elba Ramalho e Zizi Possi. Elba, que vinha de participação na peça Morte e vida severina como atriz e cantora, lançou, em 79, o disco Ave de prata, que tinha como destaque Não sonho mais, de Chico, além de Canta coração e Ave de prata. Zizi, que estreou em 78, deixou para a posteridade suas interpretações para Pedaço de mim, de Chico, Nunca e Luz e mistério, integrantes de seu segundo disco, Pedaço de mim. Estrearam, ainda, Ângela Rô Rô, que brilhou como cantora e compositora com Tola foi você e Amor meu grande amor, Marina Lima e os grupos A Cor do Som, Boca Livre e 14 Bis.

Logo após a experiência conjunta dos Doces Bárbaros, Caetano Veloso, Gal Costa, Gilberto Gil e Maria Bethânia reinvadiram, a sós, o solo fértil da nossa música. Em 1977, Caetano atacou de Bicho, que louvava, nas canções, vários espécimes de seres vivos (Gente, Um índio, Tigresa, O leãozinho). Um ano depois, lançou o disco Muito, que se hoje não é muito lembrado, trazia pérolas eternas, como Sampa e Terra, além de Muito romântico, também gravada por Roberto Carlos. Em paralelo aos dois trabalhos, lançou Muitos carnavais - apenas com marchinhas e frevos - e um disco ao vivo, com Bethânia. Fechou a década com Cinema transcendental, que incluía Lua de São Jorge, Beleza pura, Menino do Rio e Cajuína.

Depois do disco Refazenda, de 1975, Gil completou a trilogia “Re” com Refavela (77) e Realce (79), que nos presentearam com canções como Aqui e agora, Sandra, Super-homem, Toda menina baiana, Não chore mais, além das que deram nome aos discos. Ainda dividiu com Rita Lee o álbum Refestança (78), época em que a cantora compôs, com Paulo Coelho, as duas versões de Arrombou a festa*, em que caçoava da MPB. Bethânia em Álibi e Gal em Água viva deram voz e graça a canções de grandes compositores como Chico, Caetano, Gil e Gonzaguinha. A primeira com O meu amor, Diamante verdadeiro, Cálice e Explode coração e a segunda com Folhetim, Mãe, De onde vem o baião e O gosto do amor, entre outras.

Fora os bárbaros baianos, uma nova leva de retirantes, incluindo Elba, colocou ainda mais nos eixos nordestinos a música brasileira de então: Zé Ramalho, que já havia lançado o experimental Paêbirú, com a boa companhia de Lula Côrtes, contribuiu, nos dois primeiros trabalhos de sua carreira solo, com Vila do sossego, Chão de giz, Bicho de sete cabeças, Admirável gado novo, Frevo mulher, entre outras. Fagner, que começara a carreira no início da década, alcançou, com os discos Quem viver chorará (78) e Beleza (79), o auge do sucesso de público e crítica. Revelação e Noturno foram os grandes destaques desses dois álbuns.

A cantora Simone também marcou época com seu LP Pedaços, de 1979, no qual interpretava temas sobre encontros, como o samba Tô voltando, que virou hino da anistia e sobre separações, como Começar de novo e Saindo de mim ("você foi saindo de mim por todos os meus poros e ainda está saindo nas vezes em que choro"), ambas de Ivan Lins e Vítor Martins. E mais: Outra vez, de Isolda, Pedaço de mim e Sob medida, de Chico Buarque.

Roberto Carlos continuou sua cavalgada em torno do sucesso com um bom disco, em 1977, em que todas as músicas tocaram em rádio. Falando sério, amigo. Roberto, outra vez, lançou disco muito romântico e ainda homenageou a Jovem Guarda, com Jovens tardes de domingo. Nos anos seguintes, num gesto familiar, fez coro com Pai e mãe de Gil, Mãe de Caetano e Pai de Fábio Júnior, ao presentear a mãe e o pai com Lady Laura e Meu querido, meu velho, meu amigo, com direito a Café da manhã, ainda que sovinamente requisitado: “vou pedir um café pra nós dois.



* Arrombou a festa II (Rita Lee - Paulo Coelho)

Ai, ai, meu Deus, o que foi que aconteceu
Com a música popular brasileira?
Quando a gente fala mal, a turma toda cai de pau
Dizendo que esse papo é besteira

Na onda discoteque da América do Sul
Lenilda é Miss Lene, Zuleide é Lady Zu
Pra defender o samba contrataram Alcione
É boa de piston mas bota a boca no trombone
No meio disso tudo a Fafá vem dar um jeito
Além de muita voz, ela também tem muito peito
E a música parece brincadeira de garoto
Pois quando ligo o rádio ouço até Cauby Peixoto
Cantando: “Conceição!”

Ai, ai, meu Deus, o que foi que aconteceu
Com a música popular brasileira?
Quando a gente fala mal, a turma toda cai de pau
Dizendo que esse papo é besteira

O Sidney Magal rebola mais que o Matogrosso
Cigano de araque, fabricado até o pescoço
E o Chico na piscina grita logo pro garçon
Afasta esse cálice e me traz Moët Chandon
Com tanto brasileiro por aí metido a bamba
Sucesso no estrangeiro ainda é Carmen Miranda
E a Rita Lee parece que não vai sair mais dessa
Pois pra fazer sucesso arrombou de novo a festa

Ziri, ziriguidum, skindô, skindô, lelê
Sai da frente que eu quero é comer
A música popular brasileira
Lady Laura
A música popular
Parabéns a você, parabéns para a...
Música popular
Oh, eu te amo, oh, eu te amo, meu amor
Ai Sandra Rosa Madalena
O meu sangue ferve pela...
Música popular
Oh, fricote, eu fiz xixi
Fricote, eu fiz xixi
Na música popular brasileira
Corre que lá vem os "hóme"!

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