Dentre os filmes nacionais que retratam as dificuldades enfrentadas
pelas camadas mais carentes da população, há aqueles que o fazem
de maneira explícita, contundente, retratando miséria e violência
de forma crua e os que mostram a realidade de maneira mais suave e
poética. Na filmografia nacional mais recente, Cidade de Deus
(Fernando Meirelles, 2002) e Central do Brasil (Walter
Salles, 1998), respectivamente, seriam os melhores
representantes de um e outro estilo, ambos válidos nos aspectos de
conscientização ou indução a reflexão, mas cada um com suas
armas e cada arma atingindo diferentes alvos.
Vencedor de vários prêmios no último Cine-PE – melhor
filme nos júris oficial e popular, roteiro (Patrícia Andrade), ator
(João Miguel) e ator coadjuvante (Vinícius Nascimento) - À beira do caminho* (Breno Silveira, 2012), é
o mais novo exemplar dos filmes do segundo grupo. O ator João Miguel
é conhecido pela atuação em Cinemas, Aspirinas e Urubus
(Marcelo Gomes, 2005) e Vinícius Nascimento já se destacara, com
sua espontaneidade, em Ó paí, ó (Monique
Gardenberg, 2007), como um dos irmãos Cosme e Damião, filhos
da evangélica dona Joana, que são assassinados, numa das poucas
cenas dramáticas do filme.
Breno Silveira, que iniciou carreira como diretor de fotografia, tem
colocado a música em destaque, em seus trabalhos como diretor, seja
como pano de fundo para a trama, como é o caso de À beira do
caminho, seja como elemento-chave, em dois filmes de conteúdo
biográfico: 2 filhos de Francisco (2005), sucesso de
bilheteria e Gonzaga – de pai pra filho, com estreia programada para 2012,
quando se comemora o centenário de nascimento de Luiz Gonzaga.
À beira do caminho é recheado de canções - bem escolhidas
- do repertório de Roberto Carlos, desde A distância, no início, a O portão, no final, parcerias dele com
Erasmo Carlos. Para driblar dificuldades de liberação de mais
composições da dupla, o diretor utilizou o recurso de incluir
aquelas do repertório de Roberto que não são de sua autoria, umas
na voz dele, como Outra vez
(Isolda), umas na voz de outros intérpretes, como Vanessa da
Mata em Nossa canção (Luiz
Ayrão) e Antônio
Marcos em Como vai você
(Antônio Marcos / Mário Marcos).
O enredo de À beira do caminho guarda semelhanças com
Central do Brasil também no
estilo 'filme de estrada' ou 'road movie', que tem como
principal característica o desenrolar da trama durante uma viagem,
um percurso, sem locação fixa (O estilo voltou a ser destaque com o
lançamento recente de outro filme de Walter Salles, On the road,
baseado no livro homônimo, de Jack Kerouac, que marcou época nos
anos 60). A semelhança estende-se à própria trama, em que um
adulto e uma criança têm seus destinos cruzados e estabelecem
fortes laços afetivos, enquanto caem na estrada. Similaridades
também são percebidas em relação a O caminho das nuvens
(Vicente Amorim, 2003), outro road movie em que a música de
Roberto Carlos está presente.
O argumento, familiar como as composições de Roberto, emociona e
convence, com o auxílio de dois recursos infalíveis: criança e
música. O menino Vinícius é mais um exemplo de impressionante
talento precoce, que traduz os sentimentos do personagem com
perfeição tal, que nos atinge em cheio. Emoções à flor da pele,
composições de destinos, como cabe a um filme de estrada, de
passagens resumidas em frases de para-choque de um caminhão sem
destino certo, a conduzir o destino incerto de seus passageiros.
* Sinopse:
A emocionante história de João, um homem que encontra na estrada
uma saída para esquecer os dramas de seu passado. Por acaso ou
sorte, seu caminho se cruza com o de um menino em busca do pai que
nunca conheceu. A partir desse encontro, nasce uma bela relação que
movimentará o delicado equilíbrio construído por João para
enfrentar seus fantasmas. De Breno Silveira, o diretor de 2 Filhos de
Francisco, À Beira do Caminho evoca e se inspira em letras de
sucessos de Roberto Carlos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário