O pertencer a uma mesma
geração proporciona uma série de cumplicidades às pessoas, sendo
a música uma das mais diretas e representativas. A
contemporaneidade, logicamente, não implica em homogeneidade de
inclinações, mas cria certos vínculos emocionais. Pessoas de
gerações diferentes, mesmo com gosto musical parecido, não
vivenciam essa cumplicidade, uma vez que ela é construída não por
identidade de gosto, mas com base em momentos em comum vividos numa
mesma fase da vida e ao longo do tempo.
A morte do cantor Wando e
como ela repercutiu de forma diferente em diferentes gerações,
muito ou pouco sentida, ilustra bem essas reflexões. Muito se
questionou o fato de ele ter sido endeusado e reverenciado, por
alguns, apenas depois de morrer. Pode ser, isso ocorre com frequência
- ou, como diria Cauby, essas coisas acontecem por aí naturalmente
-, mas alguns desses depoimentos pareceram sinceros e é provável
que tenham partido justamente de alguns de seus contemporâneos.
O moço mineiro tinha
público cativo e sua popularidade remonta à década de 70, quando O importante é ser fevereiro foi gravada por Jair Rodrigues.
Pouco depois, ele compôs Moça*,
que o posicionou, perante a mídia, na categoria dos cantores
românticos - ainda não existia o termo brega. A música fez parte
da trilha sonora da primeira versão da novela Pecado Capital
e foi regravada, anos depois, por CaetanoVeloso. Na mesma linha e na mesma época, Wando compôs A menina e o poeta**, bonita, mas pouco conhecida, mesmo tendo
sido gravada por Roberto Carlos, em seu disco de 1976. Nesse mesmo
período, despontaram, também, Agepê, Hildon, entre outros.
Já nos anos 80, Chora coração, tema da novela Roque Santeiro e Coisa cristalina foram grande destaque, mas nada comparável a Fogo e paixão, seu maior sucesso, um “Ai se eu te pego”
da época que, com sua letra quente, consolidou a fama de amante
latino do cantor e o hábito de seus iaiás e ioiôs de jogarem peças
íntimas no palco. Ele afirmava, porém, que essa aproximação com o
público feminino sempre fora seu objetivo, desde o início da
carreira.
Ninguém atravessou
incólume os anos 80 que, ao proporcionar a ruptura da fronteira
entre estilos musicais, representou uma espécie de retropicalismo,
somado a grandes porções de jovem guarda. Há semelhanças entre o
é proibido proibir tropicalista e o vale tudo ou libera geral
oitentista, quando cantores mais populares passaram a frequentar
espaços elitizados, antes exclusivos e restritos, como as rádios FM
ou as casas de show voltadas para as classes mais abastadas. Com
Wando, não foi diferente. Aquela que já cantarolou uma música
dele, que atire a primeira calcinha, a segunda, a terceira...
*
**
A menina e o poeta (Wando)
Virgem menina morena
Nos cabelos uma trança
No rosto um jeito criança
Na voz um canto mulher
Nos cabelos uma trança
No rosto um jeito criança
Na voz um canto mulher
Virgem menina morena
Nos olhos toda a primavera
No corpo uma longa espera
Coração banhado em fé
A tarde corre pra noite
A lua desperta sorrindo
A menina na janela
Botão em flor se abrindo
A lua desperta sorrindo
A menina na janela
Botão em flor se abrindo
Nasceu o primeiro desejo
Conhecer o primeiro amor
Na história de um poeta
A menina acreditou
Conhecer o primeiro amor
Na história de um poeta
A menina acreditou
Mas o poeta foi um dia
E até hoje não voltou
Ninguém sabe o caminho
Que o poeta levou
E até hoje não voltou
Ninguém sabe o caminho
Que o poeta levou
O vento que foi com ele
Um dia por lá voltou
Mas só que voltou sozinho
E a menina chorou
Um dia por lá voltou
Mas só que voltou sozinho
E a menina chorou
Na história do poeta
A menina acreditou
E dos olhos da menina
Uma lágrima rolou
A menina acreditou
E dos olhos da menina
Uma lágrima rolou
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