25.4.10

O filho da mãe

Roberto Carlos Braga é brega? Chega de briga. Como previ, há alguns meses, não adianta nem tentar lhe esquecer. O cantor e compositor vem, desde o ano passado, comemorando seus cinquenta anos de carreira e, no ano que vem, completará setenta de idade, o que motivará, mais uma vez, merecidas comemorações. Por sinal, ele estará puxando o bloco dos setentões, que se aproxima, com Chico e Caetano, entre outros, logo atrás.

Uma dessas homenagens prestadas, nos últimos meses, ao rei, está ao alcance de quem andar por São Paulo por esses dias: a exposição Roberto Carlos – 50 anos de música, que acontece na Oca do Parque do Ibirapuera e que ele mesmo ajudou a organizar. A exposição aproxima-se do final e traz, entre as atrações, documentários e vídeos sobre sua carreira, bem como depoimentos de pessoas importantes em sua trajetória artística, como o parceiro Erasmo Carlos, Wanderléa, Gal Costa, Maria Bethânia e Caetano Veloso.

Gal, em seus primeiros discos, gravou várias canções da dupla Roberto e Erasmo, como Se você pensa e Eu sou terrível, além de uma interpretação definitiva e insuperável de Sua estupidez, cuja bela letra é uma forma mais rebuscada e poética de dizer “você não vale nada, mas eu gosto de você”. Sua estupidez é do disco Fatal, de 1971 - fatal, inclusive, no excelente repertório (só para dar uma ideia... não dá para dar uma ideia a não ser enumerando quase todas as músicas, então deixo apenas a ideia da ideia).

Engraçado que essas canções, bem apropriadas ao perfil ou estilo criado, à época, pela cantora baiana, diziam frases fortes que o próprio RC, hoje em dia, em outra fase, ou Bethânia, por exemplo, não diriam (pior pra eles), como “você tem que aprender a ser gente” e “use a inteligência uma vez só” (só faltou Quero que vá tudo pro inferno). Nesse mesmo período, Gal recebeu da dupla a canção Meu nome é Gal, feita especialmente para ela, como não é difícil perceber. Bethânia, por sua vez, além de ser um dos poucos artistas a ter participação em algum disco de Roberto (em 1982, na faixa Amiga), gravou disco inteiro, As canções que você fez pra mim (1994), com composições do rei.

Caetano, em seu incentivo à luta contra qualquer tipo de preconceito musical, sempre se preocupou, ao longo da carreira, em desfazer qualquer rivalidade entre Tropicalismo, Bossa Nova e Jovem Guarda. Depois de uma troca de amabilidades que nos proporcionou interpretações marcantes de músicas de sua autoria por parte de Roberto (Como dois e dois, Muito romântico, Força estranha) e vice-versa (Debaixo dos caracóis de seus cabelos), coroou bem sua linha de comportamento ao participar, recentemente, do trabalho que reuniu essas três vertentes da produção musical dos anos 60: o disco Roberto Carlos e Caetano Veloso e a música de Tom Jobim (2008), em que o rei da Jovem Guarda e o mestre do Tropicalismo uniram-se, em reverência ao maestro da Bossa Nova.

Sou de um tempo em que aguardar os lançamentos de trabalhos desses artistas, ano após ano, já era, por si só, atividade extremamente aprazível, seguida de plena recompensa, exercício do qual os discos de Roberto Carlos faziam parte. Por isso, em época de tantas homenagens a esse astro da nossa música, acrescento mais essa, que tem motivos de sobra para acontecer especificamente por esses dias. Primeiro, o aniversário do cantor, que ocorreu esta semana, depois, o dia das mães que se aproxima e que nos remete à lembrança de uma das maiores mães da MPB, a quem devemos sua vinda ao mundo - Lady Laura*, reverenciada pelo filho em um desses discos esperados -, por meio de quem homenageio todas elas.



* Lady Laura (Roberto Carlos / Erasmo Carlos)

Tenho às vezes vontade de ser novamente um menino
E na hora do meu desespero gritar por você
Te pedir que me abrace e me leve de volta pra casa
Que me conte uma história bonita e me faça dormir

Só queria ouvir sua voz me dizendo sorrindo:
Aproveite o seu tempo, você ainda é um menino
Apesar da distância e do tempo eu não posso esconder
Tudo isso eu às vezes preciso escutar de você

Lady Laura, me leve pra casa
Lady Laura, me conte uma história
Lady Laura, me faça dormir
Lady Laura

Lady Laura, me leve pra casa
Lady Laura, me abrace forte
Lady Laura, me faça dormir
Lady Laura

Quantas vezes me sinto perdido no meio da noite
Com problemas e angústias que só gente grande é que tem
Me afagando os cabelos você certamente diria:
Amanhã de manhã você vai se sair muito bem

Quando eu era criança podia chorar nos seus braços
E ouvir tanta coisa bonita na minha aflição
Nos momentos alegres sentado ao seu lado eu sorria
E nas horas difíceis podia apertar sua mão

Tenho às vezes vontade de ser novamente um menino
Muito embora você sempre acha que eu ainda sou
Toda vez que te abraço e te beijo sem nada dizer
Você diz tudo que eu preciso escutar de você

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